Screenshot 2025 06 27 at 10.38.55

Abaixo o imperialismo português, abaixo a NATO!

A chamada “guerra dos doze dias”, na qual Israel e os EUA bombardearam criminosamente o Irão, representa uma perigosa escalada numa situação já por si muito tensa no Médio Oriente e no mundo, caraterizada pelo acirramento dos conflitos inter-imperialistas. O frágil cessar-fogo anunciado por Donald Trump não resolve as tensões subjacentes: trata-se de uma precária paz imperialista, que só prepara o terreno para novos enfrentamentos no futuro. Já temos analisado as causas do conflito, nomeadamente a tentativa, por enquanto infrutuosa, do imperialismo israelita e norte-americano de travar o ascenso regional do regime capitalista iraniano, esmagando e devastando o país e afundando-o na barbárie como já fizeram no Iraque, no Afeganistão, na Líbia e na Síria.

A guerra foi protagonizada pelos EUA e por Israel, mas nós comunistas devemos lembrar sempre as palavras do revolucionário alemão Karl Liebknecht: o inimigo está em casa. Apesar do seu papel ridículo e insignificante, o imperialismo português deu o seu pequeno contributo à irresponsável escalada bélica de Israel e dos EUA, enquanto o público português foi bombardeado com uma vaga de mentiras e de propaganda sem precedentes, que nada teria a invejar aos boletins da Emissora Nacional nos tempos do Estado Novo.

Mentiras e hipocrisia

Qual foi a reação do governo português quando Israel iniciou a guerra com o seu ataque não provocado?

“Portugal segue com enorme preocupação o agravamento da situação no Médio Oriente. Exorta à máxima contenção, evitando uma perigosa escalada e reabrindo canais diplomáticos. Estamos em contacto com as nossas missões diplomáticas para assegurar a proteção dos portugueses na região.”

A quem pedia Portugal contenção? À potência agredida, ao Irão, que era chamado naquela altura a responder à inesperada agressão israelita do dia 13. Ou seja, pede-se contenção à vítima. É como se alguém estivesse a receber uma surra por dois valentões e a multidão que observa passivamente lhe exige que não reaja.

Relembremos os factos: a guerra começou com a agressão unilateral e devastadora de Israel contra o Irão no dia 13 de Junho, contrária a todas as leis internacionais, que, segundo a carta da ONU, permitem a “autodefesa” só “no caso de ocorrer um ataque armado” ou no caso de uma ameaça iminente e verificada. Mas nesse caso quem deveria ter começado a guerra teria sido o Irão, já alvejado várias vezes nos últimos anos por Israel! Foi Israel quem violou a soberania e ocupou o território do Líbano e na Síria no último ano e quem está a praticar um genocídio contra o povo palestiniano, segundo as próprias Nações Unidas (acusações ecoadas por Paulo Rangel há só umas semanas). Israel é a única potência nuclear do Médio Oriente, e nunca assinou o tratado de não proliferação (ratificado, sim, pelo Irão). Além do ataque ser totalmente ilegal, empregaram-se métodos abertamente terroristas, como as ameaças de morte contra funcionários do regime iraniano e contra as suas famílias.

Ora, obviamente, estas leis internacionais, assim como a própria ONU, são só uma cortina de fumaça, contornadas ou ignoradas pelos imperialistas quando lhes convém. Mas resulta paradoxal que o nosso governo, que se enche a boca com a “ordem mundial baseada em regras”, ignore agora tão abertamente as regras mais rudimentares do direito internacional.

Ucrânia e Israel

Foi o suposto direito internacional que justificou o apoio ocidental à Ucrânia, apoio esse que tem gerado uma grave instabilidade na Europa, e que tem tido um enorme custo económico, com Portugal a doar centenas de milhões de euros para financiar a chacina no Donbass, dinheiro que poderia ter sido dedicado a escorar o SNS ou o ensino público em Portugal (e, diga-se, doações totalmente inúteis que não evitaram a derrota militar ucraniana). Mas diz Montenegro, como dizia outrora António Costa, que estas ajudas ao governo ucraniano são necessárias para defender a “ordem internacional baseada em regras”. O que disse naquela altura o predecessor de Montenegro na chefia do PSD, Rui Rio?

“Hoje é um dos dias mais tristes do pós-Guerra Fria. Apesar de lhe ter sido oferecida a paz, a Rússia optou pela guerra. A decisão de invadir a Ucrânia é ilegal, desnecessária e inaceitável. E, com o mundo a ver, é preciso deixar claro que estas acções acarretam fortes punições.”

O Ministro dos Negócios Estrangeiros português naquela altura, o socialista Cravinho, afirmou:

“É muito difícil dizer que a invasão da Rússia tenha a ver com a não adesão da Ucrânia à NATO. Penso que não há nenhuma justificação para a invasão da Ucrânia, não havia nenhum tipo de ameaça à segurança da Rússia.”

Mas a adesão da Ucrânia à NATO colocá-la-ia sob o guarda-chuvas nuclear dos EUA, através do artigo 5 do tratado da aliança! Ou seja, no caso de Israel (potência nuclear que está a violar a soberania do Líbano e da Síria e que é acusada pela ONU de genocídio), o medo pela potencial “ameaça nuclear” do Irão (potencial porque o Irão não tem armas nucleares, e não vai as conseguir no meio prazo!), é razoável e até justificaria um ataque “preventivo”, mas no caso da Rússia, onde a ameaça da NATO não era potencial, mas real, esse medo não teria “nenhuma justificação”.

Umas semanas depois do início da guerra na Ucrânia, após o suposto massacre em Bucha onde, segundo fontes ucranianas, morreram 501 pessoas, Rui Rio exclamou:

“Não tenho palavras para classificar esta barbárie. Não vejo qualquer diferença entre os crimes nazis e estes dos russos. Se esta guerra durasse os mesmos seis anos da segunda guerra mundial, o balanço final dos assassínios do regime de Putin não andaria longe dos de Hitler.”

Mas Rui Rio e os seus colegas no PSD nada dizem sobre as verdadeiras atrocidades de Israel em Gaza, ao lado das quais o que aconteceu em Bucha parece uma brincadeira. Putin é um simples amador ao lado do genocida Netanyahu. O genocídio em Gaza (reconhecido como tal pelo próprio Paulo Rangel, embora timidamente) nem justificou sanções portuguesas, nem rutura de relações diplomáticas e comerciais, nem o financiamento e armamento do povo palestiniano para a sua legítima defesa contra o massacre. Pelo contrário, no início da chacina em Gaza em 2023 o governo Costa fez a sua pequena parte para justificar o genocídio ao reconhecer “o direito de Israel a defender-se” (pulverizando a faixa de Gaza).

Em 2022, o governo português também pareceu muito preocupado pelo perigo de poluição radioativa quando aconteceram combates entre a Rússia e a Ucrânia na planta nuclear de Zaporizhia. O Primeiro-Ministro na altura, António Costa, ligou Zelensky para falarsobre o bombardeamento russo à central nuclear de Zaporizhzhya. A segurança nuclear não deve ser comprometida por ataques indiscriminados.” Mas nesta ocasião, quando Israel e EUA estão a alvejar conscientemente as plantas nucleares do Irão, com um potencial de fugas radioativas muito maior, o governo português não exprimiu nenhuma preocupação, nem ligou o governo iraniano para exprimir a sua solidariedade; pelo contrário, encorajou tacitamente os bombardeamentos norte-americanos, como explicaremos a seguir.

Ouvimos agora denúncias do governo AD sobre a “ditadura teocrática” iraniana. Mas esse é o mesmo governo que há uns meses louvava a sua parceria com o regime fundamentalista na Arábia Saudita, com o Ministro das Infraestruturas a convidar os xeiques wahabitas a Oerias e a afirmar que “Portugal e a Arábia Saudita têm um imenso potencial para trabalhar juntos. […] Estamos prontos para construir pontes com mercados emergentes e diversificados, como o saudita, que têm um potencial significativo para o crescimento económico mútuo.”

O que explica esta dissonância cognitiva dos políticos burgueses, que aplicam uns critérios à Rússia ou ao Irão e outros, diametralmente diferentes, a Israel ou à Arábia Saudita? As regras, os princípios, os direitos humanos, a soberania, a democracia, são palavras totalmente vazias na boca dos imperialistas, usadas cinicamente para defender os seus interesses, nomeadamente a conquista de mercados, de áreas de influência e de contra-arrestar potenciais rivais. Em 2022, para os europeus e os norte-americanos, tratava-se de defender a sua esfera de influência na Europa oriental, enfraquecendo o imperialismo russo em ascensão. Em 2025, trata-se de escorar o seu baluarte no Médio Oriente, Israel, e debilitar o seu principal adversário na região, o Irão. Os princípios e as leis nada têm a ver com estes cálculos: são apenas um verniz para disfarçar os interesses predadores dos imperialistas.

Obedecendo o amo

Voltando aos acontecimentos, os chamados à negociação dos países europeus foram ouvidos por uma das partes do conflito: pelo agredido. O ministro iraniano dos Negócios Estrangeiros reuniu-se com vários representantes europeus em Genebra no dia 20 de junho, enquanto as bombas continuavam a cair em Teerão. Em Genebra, o ministro teve de escutar as admoestações dos seus colegas sobre o programa nuclear iraniano “que não tem qualquer objetivo civil credível”. O representante iraniano, de forma muito razoável, e em sintonia com a lei internacional, respondeu que o seu país está “pronto a considerar a diplomacia novamente quando a agressão parar”.

Ora, a abordagem dos europeus mudou nos dias 21 e 22, passando de apelos platónicos à negociação e daquele seu teatrozinho em Genebra, a uma linguagem abertamente belicista. O que tinha acontecido? Foi nessa altura quando Trump resolveu lançar-se contra o Irão, bombardeando três instalações nucleares na madrugada do dia 22.

No dia 22 de junho, Luís Montenegro emitiu o comunicado em português e inglês (caso os seus amos em Bruxelas e Washington não percebam o português):

“O programa nuclear do Irão é uma séria ameaça à segurança mundial, pelo que não pode prosseguir. Muito preocupado com o risco de grave escalada no Médio Oriente, apelo à máxima contenção de todas as partes e ao regresso às negociações com vista a encontrar uma solução diplomática.”

Dir-se-ia que o nosso primeiro-ministro fez um copy paste dos seus chefões em Bruxelas. Ursula Von der Leyen tinha dito no dia anterior:

“O Irão nunca deve adquirir a bomba. Com as tensões no Médio Oriente a atingirem um novo pico, a estabilidade deve ser a prioridade. E o respeito pelo direito internacional é fundamental. Agora é o momento para o Irão procurar uma solução diplomática fiável. A mesa das negociações é o único local para pôr fim a esta crise.”

Incríveis declarações: o Irão novamente é atacado, somando-se aos bombardeamentos israelitas a maior superpotência militar do mundo, os EUA, que já arrasaram os vizinhos Iraque e Afeganistão e sumiram a Síria no caos, e a Montenegro e os seus amigos europeus só lhes ocorre denunciar o Irão e a chamar a que “volte às negociações”, justificando a ofensiva norte-americana e israelita tacitamente ao afirmar que o programa nuclear supõe uma “séria ameaça”.

Voltamos a ver aqui o filme de 2003 sobre as “armas de destruição massiva” iraquianas, novamente com o apoio dos média capitalistas. É um disco bastante riscado. Há trinta anos que Netanyahu alerta sobre a iminência do armamento nuclear do Irão, afirmando em 2012, por exemplo, que “na próxima primavera, no máximo no próximo verão… Irão terá terminado o enriquecimento do meio e passarão à fase final”.  Treze anos mais tarde continua a bater na mesma tecla. Na verdade, o Irão está a ser atacado precisamente porque não tem armas nucleares. O facto do Irão não ter armas nucleares, nem estar perto de as conseguir, foi reconhecido em março pela própria Tulsi Gabbard, diretora de inteligência do governo Trump! Relembremos, por outro lado, que Netanyahu governa uma potência nuclear que nunca assinou o tratado de não proliferação, e que atua como um verdadeiro capanga na região, ocupando neste momento território sírio e libanês, construindo colonatos ilegais na Cisjordânia e massacrando a população de Gaza.

Cumplices no crime

Na véspera dos ataques norte-americanos contra plantas nucleares no Irão, doze aviões de guerra abasteceram-se na base das Lajes, nos Açores. Estas movimentações de aviões e barcos faziam parte do fortalecimento da presença norte-americana no Médio Oriente na véspera da agressão. Formalmente, a utilização das Lajes por forças estrangeiras requer a permissão do governo português. Assim, o governo AD ajudou a ilegal ofensiva norte-americana e israelita, fornecendo infraestruturas pagas e mantidas por Portugal para sustentar a maquinaria de guerra dos EUA. Uma ajuda insignificante? Digamos que é uma ajuda à altura do miserável, fraco e submisso imperialismo português, cujo principal “trunfo” é o de alugar as suas ilhas atlânticas aos seus amos do outro lado do Atlântico, num fiel reflexo da mentalidade rentista da burguesia portuguesa. Como explicou o almirante e candidato presidencial Gouveia e Melo, exprimindo fielmente a atitude servil e escrava da burguesia portuguesa:

“Nós somos um país marítimo que tem uma relação muito forte com a potência dominante marítima, que são os Estados Unidos, e as Lajes fazem parte desse processo.”

Uma relação muito forte, sim, tão forte como a que vincula o cão de colo ao amo! O governo AD, que se gaba do seu patético patriotismo e da… “raça lusitana”, é, na prática, uma marionete dos EUA e da NATO. 

O mais lamentável é que Portugal se atrela assim a uma aventura militar condenada ao fracasso, como se verificou no cessar-fogo do dia 24. Israel e os EUA não cumpriram nenhum dos seus objetivos, nem destruíram o programa nuclear iraniano e nem derrubaram o regime dos aiatolás que, de certa maneira, sai fortalecido do embate. 

Portugal, como o resto de países europeus, age novamente como um satélite submisso dos norte-americanos. Há motivos para isto. Não é um capricho, uma “traição” ou uma simples “política errada”. A Europa está fragmentada em minúsculos Estados nacionais burgueses, que não são apenas demasiado pequenos para poder concorrer eficazmente com grandes potências como os EUA, China, ou até Rússia, mas que, ainda pior, estão fatalmente divididos, lutando os uns contra os outros pelos seus interesses mesquinhos e provincianos. Neste contexto, os EUA surgiram desde 1945 como o grande árbitro e elemento aglutinador do capitalismo europeu, permitindo-lhe recompor-se depois da guerra, dando-lhe palco para continuar a agir a nível mundial como força imperialista (secundária), e até facilitando o processo de unificação que conduziu à formação da União Europeia. Sem esse guarda-chuvas americano, o capitalismo europeu seria ainda menos do que é hoje. Isso explica o desespero com que os políticos capitalistas europeus se aferram às saias de Washington, e o terror com que olham à ameaça de Trump de reduzir a sua presença no continente.

Contra o imperialismo, pelo socialismo

Como Trotsky costumava dizer, a política externa é a continuação da política interna. O governo que promove guerras criminosas no estrangeiro e que contribui a sustentar a maquinaria militar israelita, e que promete agora aumentos espetaculares na despesa militar para continuar as suas aventuras imperialistas (incluindo a adesão ao objetivo, totalmente insensato, de atingir um 5% do PIB em gasto militar) é o mesmo governo que ataca em Portugal a lei de greve, o direito às férias pagas, aumenta as propinas, privatiza aos poucos a saúde e oprime selvagemente os trabalhadores migrantes. É um governo burguês que serve os interesses exploradores de uma minoria de parasitas, quer dentro do país, quer lá fora.

Portanto, a luta contra o imperialismo está interligada à luta de classes contra os “nossos” capitalistas. Não se trata aqui de defender os “interesses nacionais”, como afirma o PCP, porque a nação está dividida entre classes antagônicas. Não se trata, como diz Paulo Raimundo, de reclamar “soberania nacional” (soberania para a “nossa” classe dominante!), trata-se de unir a classe trabalhadora de todos os países contra os capitalistas. 

A política imperialista de Montenegro é um reflexo dos interesses da sua classe, da classe burguesa. O imperialismo não é simplesmente uma política externa belicista, mas é uma expressão da necessidade objetiva das burguesias dos países mais desenvolvidos de ir além das suas estreitas fronteiras nacionais e conquistar novos mercados através das guerras e da pilhagem. Para acabar com o imperialismo, temos de ir à sua raiz, a um sistema capitalista obsoleto e apodrecido, em Portugal e no mundo.

Spread the love

About Arturo Rodriguez

Check Also

Screenshot 20250427 091643 Instagram

Terramoto Político 

O Chega foi o grande vencedor da noite eleitoral. Apesar dos resultados se revelarem inconclusivos …

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

This website uses cookies. By continuing to use this site, you accept our use of cookies. 

Social media & sharing icons powered by UltimatelySocial